Carta a um novo Conselho

Esta não é uma carta de diretrizes ou de mandatos. Muito menos uma carta de intenções. Essa carta pretende ser uma carta de reconciliação. E finge representar parte da torcida, na medida em que busca encontrar um máximo denominador comum em seus medos, amores e preocupações. Hoje, o América elegeu um novo conselho de administração. E essa carta é principalmente a vocês.

No último triênio, é impossível negar que vivemos momentos mágicos e inéditos. Boas campanhas na Copa do Brasil, 3 anos de série A e duas competições internacionais. A alegria contagiante do Lisca descendo do ônibus para comemorar com os poucos de nós que se atreveram, sem a mínima gota de juízo, a enfrentar uma doença global para estar junto com o América.  Vi nosso superintendente, homem feito, correr como menino ao lado do ônibus em nossa primeira rua de fogo. Choramos com Jaílson no primeiro gol que tomamos em Assunção. Jogos históricos, com protagonistas improváveis, em cidades que nem sonhávamos. E essa é a matéria-prima do futebol: sonhos. E como sonho, tem o infeliz hábito de por vezes, acabar justamente no meio de uma grande revelação.

Isso explica por que 2023 nos doeu tanto. Começamos o ano cheio de expectativas, com um bom orçamento, um time parcialmente mantido e todo um mundo de possibilidades. E acreditem quando digo que nossa maior decepção não foi o futebol. O americano, tal qual o sertanejo de Guimarães Rosa, é antes de tudo um forte. Já passamos por mares bravios e desertos abrasadores. O futebol ruim nos entristece, mas não nos mata. O que nos doeu de fato foi o divórcio que foi criado entre nós e o time. Um time que entrou e saiu de campo quase sempre sem nos cumprimentar. Que raras vezes comemorou conosco um gol. Que nunca convidou suas crianças, nossa maior prioridade, para um encontro. Que disse frases mal-educadas e inoportunas como “E daí se cair?” a torcedores quando cobrados. E que ainda assim, só ouviu vaias quando a queda para a série B já era praticamente decretada.

Fomos massacrados até por rivais que foram colocados sob nossas cabeças, dessa vez sem culpa do time. Sofremos agressões verbais, físicas e morais. Vimos maus acordos e propostas ruins. Tudo sob olhos omissos.

Mas, antes de tudo, essa é uma carta de reconciliação, que é sempre uma tentativa de renovado amor. O americano típico nem gosta tanto de futebol. Ele ama o América e futebol por acaso, é o que o América joga. Não existem amores racionais. Amor racional é afeição. O amor não existe com indiferença, frieza, silêncio e racionalidade. O amor é irracional, quer ficar perto a qualquer custo, falar impulsivamente. Desconsidera a hora e as boas práticas, não tem dúvidas, tem ação e é tolo quase sempre, mas não fica parado. O amor é novo todo dia mesmo que tenha acabado na noite anterior.

Peço que essa carta encontre Américo, Alencar, Fernando, Márcio e Ricardo de espírito aberto e desarmado. Peço o mesmo do americano que estiver lendo essa carta. Ela é uma garrafa de náufrago, com uma mensagem de esperança de que o novo triênio aprenda as lições boas e ruins do triênio passado. Que o novo conselho de administração absorva o que foi acertado como regra e trate os erros não como acidente, mas com entendimento do engano. Que comece o novo triênio com apego a torcida, que é a razão final do clube. E convoco o torcedor para que dê um voto de confiança, independente da política interna do clube. Não podemos começar 2024 no estado atual das coisas, pois é necessário que voltemos a série A em 2025, quando começam os novos valores das ligas. Uma casa dividida não pode durar. O amor pelo América pode ser tolo sim, mas prefiro ser tolo junto aos nossos que racional entre nossos inimigos.

Jairo Viana Júnior

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